Nos últimos 12 anos atuei como atleta profissional do futebol. No Brasil em especial existe uma cultura que nos diferencia do resto do mundo. Aqui todos acreditam possuir conhecimentos profundos sobre o esporte, sem contar que a grande maioria destes supostos mestres também são craques de final de semana.

Todo torcedor tem a convicta certeza ou então desconfia que joga muito mais que o camisa dez da sua equipe do coração. De fato, a autoestima do torcedor é bem elevada, e isto é o que nos diferencia da Europa e da Ásia, onde os torcedores enxergam os atletas como artistas e astros que representam uma arte na qual eles não teriam a capacidade de realizar.

Em um país pobre e em desenvolvimento, ter motivação, alegria e entusiasmo para jogar futebol são mais que uma obrigação. Não se leva em conta que por trás do atleta exista um ser humano com demandas e dificuldades. Alguém que possa perder o sentido e o significado de sua profissão ao passar por problemas profundos de ordem emocional, psicológica ou familiar. Esta cultura que julga o atleta pelo salário que recebe precisa terminar, visto que o dinheiro não mede felicidade.

A Alemanha, por exemplo, faz o caminho da humanização do atleta, tratando com dignidade as questões mais simples, como trabalhos de desenvolvimento emocional e psicológico, enquanto que o Brasil ainda sobrevive na força da superstição, da cueca da sorte, da cor da camisa, do pai de santo, da oração do pastor, da benção do padre. Aqui ainda resiste aos altares e as demais crenças que lotam os vestiários.

Não sou cético, pelo contrário, tenho muita fé em Deus, somente aprendi separar as coisas. O nosso futebol, no entanto, está no século passado, habitando na ancestralidade das macumbas.

Emocionalmente falando somos arcaicos, primitivos, improvisados. Enquanto na Europa e nos Estados Unidos os atletas estão emocionalmente mapeados, aqui somos motivados pela gritaria do vestiário, com tapas nas costas e uns palavrões improvisados. Algumas vezes, num relâmpago, alguém da comissão traz fotos de familiares na tentativa desastrosa de trazer alguma emoção para o momento.

Não conhecemos nenhum trabalho mais profundo de conscientização e treinamento emocional, porque o conceito é que ser jogador de futebol por si só é o bastante para fulano estar motivado, feliz, alegre e contente.

É preciso ter um olhar mais cientifico e menos supersticioso, proporcionando assim mais ferramentas e oportunidades para os atletas renderem e desenvolverem suas competências e habilidades. É importante saber que eles possuem problemas familiares, desentendimentos, rancores e mágoas. Sei desta realidade. Vivenciei angustias e necessidades. A solidão das cirurgias, o abandono em uma maca no departamento médico. O desprezo depois de um resultado negativo. O deboche ante uma atuação ruim. Existem muitos sofrimentos, sacrifícios e lágrimas.

A sabedoria de botequim precisa ser transformada pelo conhecimento. Uma revolução mental precisa ocorrer, e isso se inicia ao trazer os conceitos do Coach para os vestiários. Oportunizar os atletas conhecerem suas potencialidades, desenvolvendo a autoestima, alinhando as metas, compreendendo a missão e o papel de cada um no elenco. Estruturar a motivação em eixos sólidos que possam manter os atletas unidos na mesma direção e foco. Proporcionar ao clube o conhecimento do perfil da personalidade dos seus atletas, facilitando o relacionamento e a comunicação com a comissão técnica.

Joguei futebol por muito tempo. Conheço os vestiários. Os jogadores precisam de ajuda e isso precisa ser realizado com ciência, conhecimentos e humanização. Assim daremos o primeiro passo rumo ao desenvolvimento humano no futebol.



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